Doença de Chagas é negligenciada em vários países, inclusive no Brasil

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15/04/2019

Falta ar. O corpo dói. E o tempo já não é mais o mesmo. Mas nada que impeça a caminhada da professora Nancy Dominga da Costa. São 45 anos de vida. E 45 anos de luta contra a doença de Chagas. Nancy é natural do norte de Minas e mora no Rio de Janeiro.

O pai e um irmão morreram com doença de Chagas. A mãe e os outros dois irmãos também estão afetados. O diagnóstico de Nancy chegou há seis anos, junto com um acidente vascular cerebral (AVC), que deixou parte do lado direito do corpo comprometida.

“Eu perdi um sobrinho com 29 anos, com a doença de Chagas. Ele descobriu, quando ele tinha a doença e eu pensava que não tinha. Então eu tava toda feliz que eu não tinha a doença. Sabe por quê? Eu pensava que os médicos sabiam o que é a doença de Chagas. Mas eles não sabiam. Quando eu falo médico é qualquer médico aqui do Rio de Janeiro. Eles não sabiam. Eu ia todo ano ao médico para fazer check up. Eles nunca falaram pra mim que eu tinha doença de Chagas, até eu descobrir com o AVC.”

Há três anos, Nancy, amigos e familiares resolveram criar a Associação Rio Chagas, que acolhe pessoas afetadas pela doença de Chagas. Nas feiras e bairros, eles promovem campanhas para incentivar pessoas com os sintomas a buscar diagnóstico e tratamento.

Esta semana, a iniciativa ganha um reforço especial.

A Federação Internacional de Associações de Pessoas Afetadas pela Doença de Chagas lançou uma campanha para recolher assinaturas em apoio ao reconhecimento, por parte da Assembleia Mundial da Saúde, do dia 14 de abril, como o Dia Mundial das Pessoas Afetadas por Chagas.

A data é a mesma em que há 110 anos o médico brasileiro Carlos Chagas fazia o primeiro diagnóstico, no norte de Minas Gerais. A descoberta científica é considerada uma das principais da medicina brasileira. Desde que ela ocorreu, foram notificadas milhões de mortes por doença de Chagas em diversos países. São, em média, 12 mil mortes por ano.

Carolina Batista, diretora da Unidade Médica Brasileira da Organização Médicos Sem Fronteiras, afirma que é necessário unir esforços para tirar as pessoas afetadas da invisibilidade.

“A gente pede mais atenção, mais investimentos, mais políticas públicas para que as pessoas que hoje estão afetadas por essa doença, que estão infectadas, e que não tem acesso ao diagnóstico, nem tratamento, possam ter esse acesso garantido pelas políticas sustentáveis e de longo prazo, investimentos em pesquisa para desenvolvimento de novos medicamentos e ferramentas diagnósticas.”

Atualmente, são cerca de 8 milhões de pessoas vivendo com doença de Chagas, a maior parte delas na América Latina. Apenas uma em cada dez pessoas afetadas têm o diagnóstico. Menos de 1% dos infectados no mundo recebem tratamento.

No Brasil, o número de pessoas com doença de Chagas pode chegar a 1,1 milhão.

Ana Maria Camargo faz parte de uma associação de apoio às pessoas afetadas pela doença em Campinas (SP) e integra o conselho consultivo da federação internacional de associações. A assistente social do Hospital das Clínicas explica a importância da criação do Dia Mundial das Pessoas Afetadas por Chagas.

“Essas datas, vamos dizer, mais globalizadas, mundiais, elas têm também uma grande contribuição, no sentido de dar maior visibilidade para os desafios e enfrentamentos. Precisam políticas que sejam mais efetivas para que ela não fique sendo uma das doenças das mais negligenciadas no mundo.”

A doença de Chagas é infecciosa, causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi. No Brasil e em outros países da América Latina ela é transmitida por meio do contato via pele ou oral com as fezes de um inseto chamado barbeiro. Entre os principais sintomas da doença de Chagas estão febre, inchaço, problemas intestinais e cardíacos.

A doença é crônica, pode levar à morte e precisa ser tratada com o uso de quimioterápicos. O tratamento está disponível gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS). Mais informações sobre a campanha pelo Dia Mundial das Pessoas Afetadas por Chagas estão no site chagas.msf.org.br.

Amanhã (16), na segunda reportagem desta série especial, você vai conhecer mais sobre os desafios enfrentados pelas pessoas que vivem com doença de Chagas no Brasil.

Fonte: Agência Brasil