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O que houve?

A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal (CDH) realizou nesta 5ª feira (04/02) audiência pública destinada a discutir as reformas previdenciária, trabalhista e econômica a serem encabeçadas pelo Governo em 2016.

Na ocasião estiveram presentes especialistas em assuntos previdenciários, representantes de centrais sindicais, do Ministério Público do Trabalho e de entidades em defesa dos aposentados.

Destaque

O cerne da discussão se deu em torno dos dados e dos argumentos apresentados por Denise Lobato Gentil, professora do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A especialista defendeu que as opções que o governo tem adotado em relação à previdência social estão atreladas à política macroeconômica da gestão de Dilma Rousseff e vem sendo mascaradas pela ideia de transição demográfica. Ela expôs que a previdência apresenta quadros de superávit, que paulatinamente foram reduzidos ao longo do governo Dilma.

Entre os principais pontos de sua argumentação constam:

  • O governo utiliza da enganosa ideia de que a previdência é deficitária para dar cabo ao retorno da CPMF e da reedição da Desvinculação das Receitas da União – DRU.
  • Entre 2003 e 2010 – governo Lula –, o que deu o tom do crescimento do PIB foram as políticas sociais. O que não houve no período e continua inexistente foram mudanças estruturais em política industrial no sentido de tornar o país imune a crises externas.
  • No primeiro mandato de Dilma, houve uma redefinição do papel do Estado, com viés privatizante. As desonerações passaram a ser o principal eixo do crescimento econômico, objetivando investimentos privados e geração de empregos.
  • O que houve na realidade foi uma renúncia fiscal enorme, que resultou no fracasso da economia e queda nos investimentos.
  • Perda de 1,5 milhão de postos de trabalho em 2015 e queda do rendimento real dos trabalhadores.

De acordo com Denise Gentil, a reforma da previdência é uma resposta essencialmente política e não econômica em que o governo tenta acenar ao mercado e se legitimar no poder. Nesse sentido, a gestão de Dilma adota a mesma mentalidade europeia em que o ajuste fiscal é baseado na destruição do estado de bem-estar social.

A política econômica atual causa piora do resultado fiscal à medida que dá prosseguimento ao ajuste. A opção do governo de redução de receitas e cortes de gastos é incongruente e, segundo Denise, gera o seguinte problema cíclico:

Ciclo do governo Dilma

Força de trabalho feminina

De acordo com Denise Gentil, a mudança demográfica que vive o país, de fato, exigirá maiores gastos com a previdência, por outro lado, outros setores sofrerão redução na demanda, como é o caso da educação. Haverá também uma situação favorável ao ingresso de mulheres no mercado. Nesse sentido, ela argumentou que é preciso focar no aumento da produtividade e mirar na redução da discriminação contra mulheres no ambiente de trabalho.

Terceirização

Durante a audiência, o senador Paulo Paim (PT-RS), que é o presidente da CDH, anunciou que na última 4ª feira (04/02) conversou com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), sobre o teor de seu discurso na abertura dos trabalhos legislativos, em que mencionou que a Casa deverá votar o projeto que regulamenta a terceirização e a expande para a atividade-fim (PLC 30/15 – PL 4330/04).

De acordo com Paim, o senador Renan Calheiros afirmou que há ressalvas quanto ao texto da Câmara e o que se pretende é regulamentar a situação dos 13 milhões de trabalhadores terceirizados.

Dessa forma, Renan Calheiros acena à classe trabalhadora que a expansão da terceirização para as atividades-fim sofrerá oposição no Senado e o projeto poderá retornar à Câmara apenas trazendo segurança jurídica aos trabalhadores que já são terceirizados, sem expandir as subcontratações.

Demais participações

Acerca dos demais participantes da audiência cabe destacar:

Senador Lindbergh Farias (PT/RS) comentou que há uma campanha na mídia com o intuito de distorcer os números relativos à Previdência. Em suas palavras, estão tentando impor a aplicação de um projeto neoliberal no país. Ele criticou a fala do senador Renan Calheiros quanto à pretensão em pautar o projeto da terceirização e também a autonomia do Banco Central. Em sua opinião, deve-se privilegiar a geração de emprego e o gasto social. O senador clamou que o movimento sindical esteja organizado e mobilizado contra as investidas do governo em desfavor do trabalhador. Ele se comprometeu a obstaculizar a reforma da previdência a ser encaminhada pelo governo e afirmou que as elites nacionais querem que sobre mais dinheiro para que se pague os juros da dívida cada vez mais altos.

Thaís Riedel, presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB-DF e Presidente do Instituto Brasiliense de Direito Previdenciário (IBDPrev), argumentou que o governo apresenta números para legitimar o retrocesso em matéria de direitos sociais. Da mesma forma, o governo age nos tribunais, no sentido de transformar ações jurídicas em questões econômicas. Ela defende o princípio da vedação do retrocesso, em que a sociedade precisa cada vez mais evoluir e ter uma legislação que a proteja. Em sua opinião, não há cabimento reduzir direitos quando o risco ao retrocesso é eminente. A advogada também se opôs a ideia de que há um déficit na previdência. Por fim, Thaís sugeriu que seja produzido um material que forneça informações aos parlamentares sobre questões previdenciárias. Paim acatou a ideia.

Ronaldo Curado Fleury, Procurador-Geral do Ministério Público do Trabalho, cobrou que a política das desonerações devesse ter exigido contrapartidas por parte dos setores beneficiados como expansão do emprego. Ele afirmou que há constante descumprimento da legislação trabalhista e um alarmismo desnecessário em que se propõe vender o caos para que a sociedade aceite as reformas propostas pelo governo.

Carlos Silva, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), comentou que empregadores apostam na impunidade, uma vez que o atual governo não dá a devida importância à atividade de fiscalização. Sobre a terceirização, afirmou que o tema ainda não se esgotou e que necessita ainda de muita discussão no país.

João Paulo Ribeiro, diretor de assuntos do Poder Legislativo da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB) clamou que haja um debate intenso com a sociedade civil, no intuito de atingir alta mobilização contrária ao desmantelamento do sistema brasileiro de proteção social. Em sua opinião, é preciso que se mude as diretrizes da economia para que o país retome o crescimento e haja um ambiente regulatório que garanta segurança jurídica para investimentos.

Mário Guimarães Júnior, representante da direção nacional da Fasubra Sindical, comentou que há diversos projetos que visam desmantelar o estado democrático de direito no Brasil e que estamos caminhando para uma linha de desproteção do cidadão. Em sua opinião, todos os preceitos da agenda Brasil estavam embutidos no projeto da Alca, que foi combatido no Brasil. Júnior ressaltou que as pessoas vêm perdendo direitos no governo Dilma e destacou a necessidade de se mobilizar os trabalhadores nas ruas para impedir que investidas contra a classe trabalhadora sigam adiante.

Assis Melo, ex-deputado federal, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul (RS) e representante da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), pontuou que os benefícios fiscais acabaram não gerando empregos e sugeriu que haja a taxação de grandes fortunas.

José Calixto Ramos, Presidente da Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST) comentou que a discussão da previdência é algo que sempre esteve em pauta e que não há nenhum governo que não discuta o assunto permanentemente.

Edilson Montrosi, representante da Instersindical, manifestou-se contrário à unificação de idades para a aposentadoria entre homens e mulheres, enfatizando que muitas vezes as mulheres são submetidas à dupla ou tripla jornada em função dos afazeres domésticos e responsabilidades familiares.

Valeir Ertle, Secretário Nacional de Assuntos Jurídicos da Central Única dos Trabalhadores (CUT), explicou que o que o governo defende agora não é o que pregou ao longo da campanha eleitoral em 2014 e que a proposta de reforma da previdência já ocorreu com a Medida Provisória 676/15, que instituiu o fator 85/95 progressivo. Em suas palavras, não se pode permitir que os trabalhadores que começam mais cedo se aposentem mais tarde. Para ele, a idade mínima prejudica os trabalhadores menos favorecidos, uma vez que os mais ricos começam a trabalhar mais tarde e os mais pobres cada vez mais cedo.

Floriano Martins de Sá Neto, vice-presidente de Política de Classe da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP) clamou que todos estejam unidos contra a investida do governo para restringir direitos e condenou que se estabeleça uma idade mínima de aposentadoria, independente do tempo de contribuição.

Daro Marcos Piffer, presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (SINAL), afirmou que a forma com que as informações da previdência são divulgadas causa enorme distorção e induz a sociedade a conclusões errôneas e necessidades equivocadas. Piffer criticou a política das desonerações, que, segundo ele, foi baseada em critérios subjetivos. Em suas palavras, a reforma da previdência não é um remédio que cura todos os males econômicos. Por fim, comentou sobre os lucros exorbitantes dos bancos, citando o lucro do Bradesco em 2015, que foi mais alto do que todo o valor que o governo gastou com o programa Bolsa-família.

Manoel Isidro dos Santos Neto – FENAFISCO, não vê sentido em se fazer mais uma reforma da previdência sendo que ela não está quebrada. Por fim, cobrou que haja união geral dos trabalhadores contra a agenda neoliberal que está sendo conduzida pelo Governo.

Denise Gentil em suas considerações finais pontuou que não há necessidade fiscal de uma reforma da previdência, a necessidade é política. De acordo com ela, vivemos um momento gravíssimo no retrocesso nos direitos sociais e no mundo do trabalho. O desmonte é completo. Em sua opinião, o debate político do país está restrito ao ajuste, o desenvolvimento foi ofuscado – não consta na pauta. O alvo das mobilizações deve ser a luta contra a política macroeconômica encampada pelo Governo, que é extremamente desagregadora e cruel. Denise finalizou sua participação afirmando que o ajuste fiscal está causando o bloqueio à liberdade de conquista da sobrevivência.

 

Victor Velu Fonseca Zaiden Soares – Relações Institucionais da CNTC

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