MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO – DESALENTADOS

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18/02/2019

MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO

 

INTRODUÇÃO

A Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio (CNTC), entidade representativa dos trabalhadores no comércio e serviços, apresenta análise de dados referente à evolução do trabalho durante o ano de 2018. Nesse sentido, o objetivo deste exame é apresentar as principais características do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), analisando as tendências do emprego formal observadas em cada uma das bases, bem como uma análise da evolução dos desalentados – pessoas fora da força de trabalho que estavam disponíveis para assumir um emprego, mas desistiram de procurar por não ter conseguido trabalho adequado, não ter experiência profissional ou qualificação, não haver trabalho na localidade em que residia ou não conseguir trabalho por ser considerado muito jovem ou muito idoso – não sendo possível uma comparação de dados, visto que esses são observados apenas pela Pnad Contínua, uma vez que há diferenças metodológicas importantes, em especial no que se refere à natureza, à unidade, ao universo e ao período de referência.

Tanto o Caged quanto a Pnad Contínua são importantes fontes estatísticas para a análise e a compreensão da dinâmica do mercado de trabalho brasileiro. A comparação das tendências do trabalho a partir dessas duas bases de dados é possível, na medida em que se complementam e possibilitam desenvolver ângulos distintos de reflexão. No entanto, as possibilidades de análise devem ser contextualizadas considerando as especificidades das próprias bases de dados. Assim, a comparação entre dados estatísticos oriundos do Caged e da Pnad Contínua deve ocorrer mediante a devida atenção às suas singularidades.

O Caged, coordenado pelo extinto Ministério do Trabalho (MTb), foi instituído pela Lei 4.923 de 1965, com o objetivo de registrar o saldo das admissões e dispensas de empregados nas empresas abrangidas pelo sistema da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Trata-se de um registro administrativo alimentado mensalmente por estabelecimentos formais mediante sistema eletrônico próprio.

A Pnad, coordenada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foi iniciada no segundo trimestre de 1967. Seu propósito é acompanhar a evolução da sociedade brasileira em todas as suas dimensões: trabalho, educação, demografia, habitação, economia, entre outras temáticas. Seus dados são obtidos a partir de entrevistas domiciliares, em que as informações são prestadas diretamente pelas pessoas. A Pnad anual foi substituída em 2016 pela Pnad Contínua, com metodologia atualizada.

A Pnad Contínua é realizada por meio de uma amostra probabilística de domicílios, extraída de uma amostra-mestra de setores censitários, de forma a garantir a representatividade dos resultados para os diversos níveis geográficos (Brasil, Grandes Regiões, Unidades da Federação e regiões metropolitanas). Trimestralmente, a Pnad Contínua alcança cerca de 211 mil domicílios em 16 mil setores censitários, os quais visita cinco vezes em cinco trimestres consecutivos (cada domicílio é visitado pela segunda vez após três meses, pela terceira vez três meses após a segunda visita, e assim por diante) (IBGE, 2014).

Principais características metodológicas do Caged e da Pnad Contínua

O Caged registra informações relativas a uma parcela específica da força de trabalho ocupada, conforme classificada e mensurada pela própria Pnad Contínua como empregados com carteira de trabalho assinada. No terceiro trimestre de 2018, tais empregados correspondiam a 37% da força de trabalho ocupada, de acordo com a Pnad Contínua. Desse modo, pode-se afirmar que a Pnad Contínua espelha a totalidade da força de trabalho do mercado de trabalho brasileiro, tanto ocupada quanto desocupada. Por sua vez, o Caged concentra informações sobre sua parcela mais expressiva: os empregados com carteira de trabalho assinada, ou seja, os empregos formalizados.

Brasil: força de trabalho ocupada segundo posição na ocupação (3° trim./2018)

Igualmente, uma análise da série histórica da diferença na variação relativa a cada trimestre demonstra que não há uma tendência recente de aumento na diferença entre os resultados do Caged e da Pnad Contínua, conforme tabela abaixo.

 Variação relativa do estoque de empregados na Pnad Contínua e no Caged e diferença na variação relativa

A comparação trimestre a trimestre o comprova, ainda que com diferenças de intensidade das curvas no primeiro, no segundo e no terceiro trimestres de 2014 e no primeiro, no segundo e no terceiro trimestres de 2018.

A comparação trimestre a trimestre o comprova, ainda que com diferenças de intensidade das curvas no primeiro, no segundo e no terceiro trimestres de 2014 e no primeiro, no segundo e no terceiro trimestres de 2018.

Não obstante, ao se observar o intervalo contínuo entre o terceiro trimestre de 2017 e o terceiro trimestre de 2018, verifica-se um espelhamento entre as curvas do Caged e da Pnad, com diferenças de intensidade.

Há apenas um ponto importante de dissonância: no quarto trimestre de 2017, o estoque estimado de empregos celetistas do Caged indica haver crescimento em relação ao ano 2016 (36,7 milhões para 36,9 milhões), ao passo que a Pnad Contínua sinaliza queda no estoque de 2016 face ao ano 2017 (35,2 milhões para 34,5 milhões).

Brasil: evolução comparada trimestral Caged e Pnad Contínua (1o trim./2014-1o trim./2018)

Brasil: evolução comparada trimestral Caged e Pnad Contínua (2o trim./2014-2o trim./2018)

Brasil: evolução comparada trimestral Caged e Pnad Contínua (3o trim./2014-3º trim./2018)

Brasil: evolução comparada trimestral Caged e Pnad Contínua (4o trim./2014-4o trim./2017)

Portanto, adotando-se os devidos cuidados metodológicos, pode-se concluir que existe disparidade no saldo entre a evolução do emprego celetista conforme indicada pelo Caged e pela Pnad Contínua. A utilização de procedimentos cientificamente balizados permite verificar ser justificável a alegação de que as duas pesquisas apresentam resultados díspares acerca da evolução do emprego formal.

Vale ressaltar ainda que os dados coletados pelo Caged e Pnad Contínua são diferentes, impossibilitando uma comparação mais apurada da realidade das duas instituições, a exemplo é o número de desocupados e desalentados em que o Caged não especifica ou não leva em conta em sua análise de saldo de ocupação e desocupação.

Pelo que se observa o quadro abaixo que o número de desocupados não leva em conta a força de trabalho potencial, que consiste nos desalentados e não desalentados, que representa 63,80% em relação ao número de desocupados e 4,68% em relação a população em idade de trabalhar, demonstra que o número de desempregados gira em torno de 27 milhões, bem maior do que retrata os dados do Caged, que não leva em conta o número de pessoas com força de trabalho potencial.

Observa ainda que o número da população subutilizada total representa 26% (27 milhões) em relação ao total de pessoas na força de trabalho (105 milhões).

A população subutilizada total é o somatório da força de trabalho potencial, dos subocupados por insuficiência de horas trabalhadas e de desocupados.

O número de desalentados, segundo dados da Pnad Contínua/IBGE, no 2º trimestre de 2016, quando Michel Temer assumiu a Presidência da República, era de 3,2 milhões e chegou a 4,7 milhões de desalentados no 3º trimestre de 2018, um aumento de mais de 47%.

No mercado de trabalho, o governo não conseguiu reduzir o número de desempregados, pelo contrário, segundo o IBGE, quando Temer assumiu (2º trimestre de 2016) eram 11,4 milhões e no final do 3º trimestre, 12,4 milhões, que demonstra que a reforma trabalhista de 2017 não surtiu o efeito que o governo afirmava que teria.

Para entender os dados acima, segundo o IBGE a subutilização da Força de trabalho é um conceito construído para complementar o monitoramento do mercado de trabalho, além da medida de desocupação, que tem como objetivo fornecer a melhor estimativa possível da demanda por trabalho em ocupação.

São identificados três componentes mutuamente exclusivos:

I) os subocupados por insuficiência de horas trabalhadas

II) desocupados;

III) força de trabalho potencial.

Observação: sendo que dois componentes integram a força de trabalho, itens I (subocupados por insuficiência de horas trabalhadas) e II (desocupados).

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), é recomendado que os países adotem esses indicadores principais visando a propiciar um quadro mais completo da subutilização da força de trabalho.

A fim de melhor esclarecer, na visão do IBGE, seguem os conceitos e principais indicadores.

A Força de trabalho é composta pelas pessoas ocupadas e as desocupadas na semana de referência.

Conceitos:

I) Pessoas subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas, segundo o IBGE:

São as pessoas que, na semana de referência, atendem as quatro condições abaixo:

  1. Tinham 14 anos ou mais de idade;
  2. Trabalhavam habitualmente menos de 40 horas no seu único trabalho ou no conjunto de todos os seus trabalhos;
  3. Gostariam de trabalhar mais horas que as habitualmente trabalhadas; e
  4. Estavam disponíveis para trabalhar mais horas no período de 30 dias, contados a partir do primeiro dia da semana de referência.

II) Pessoas desocupadas:

São classificadas como desocupadas na semana de referência as pessoas, segundo o IBGE:

  1. que estavam sem trabalho em ocupação nessa semana e
  2. que tomaram alguma providência efetiva para consegui-lo no período de referência de 30 dias, e
  3. que estavam disponíveis para assumi-lo na semana de referência.

Consideram-se também como desocupadas as pessoas sem trabalho em ocupação na semana de referência que não tomaram providência efetiva para consegui-lo no período de referência de 30 dias porque já o haviam conseguido e iriam começá-lo em menos de quatro meses após o último dia da semana de referência.

III) Força de trabalho potencial:

A força de trabalho potencial é definida como o conjunto de pessoas de 14 anos ou mais de idade que não estavam ocupadas nem desocupadas na semana de referência, mas que possuíam um potencial de se transformarem em força de trabalho.

Este contingente é formado por dois grupos:

I – Pessoas que realizaram busca efetiva por trabalho no período de 30 dias, mas não se encontravam disponíveis para trabalhar na semana de referência. Não se encontravam disponíveis para trabalhar em função dos seguintes motivos, segundo o IBGE:

1 Tinha que cuidar dos afazeres domésticos, do(s) filho(s) ou de outro(s) parente(s);

2 Estava estudando (em curso de qualquer tipo ou por conta própria);

3 Por problema de saúde ou gravidez;

4 Por ser muito jovem ou muito idoso para trabalhar;

5 Por não querer trabalhar;

6 Por outro motivo.

II – Pessoas que não haviam realizado busca efetiva por trabalho no período de 30 dias, mas gostariam de ter um trabalho e estavam disponíveis para trabalhar na semana de referência. Não houve busca efetiva em função dos seguintes motivos, segundo o IBGE:

  1. Conseguiu proposta de trabalho para começar após a semana de referência;
  2. Estava aguardando resposta de medida tomada para conseguir trabalho;
  3. Não conseguia trabalho adequado;
  4. Não tinha experiência profissional ou qualificação;
  5. Não conseguia trabalho por ser considerado muito jovem ou muito idoso;
  6. Não havia trabalho na localidade;
  7. Tinha que cuidar dos afazeres domésticos, do(s) filho(s) ou de outro(s) parente(s);
  8. Estava estudando (em curso de qualquer tipo ou por conta própria);
  9. Por problema de saúde ou gravidez;
  10. Outro motivo.

Trabalhador 4.0

A união da chamada internet das coisas com a rápida automatização desenha um novo cenário dentro das fábricas e na forma laboral de todo o mundo. A indústria 4.0, ou manufatura avançada, com robótica avançada, impressão 3D, Big Data (ato de coletar e armazenar grandes quantidades de informações para análises eventuais), computação em nuvem, inteligência artificial, deve revolucionar as linhas de montagem e gerar produtos inovadores e customizados em um futuro próximo. Com robôs cada vez mais participativos no processo, mudará também o perfil do profissional que as empresas procuram.

Tamanha mudança demandará qualificação profissional e adaptação do perfil profissional à capacidade técnica frente às inovações tecnológicas. O trabalhador que quer conquistar espaço no mercado do futuro deverá desenvolver novas habilidades. Será preciso, por exemplo, aprender a trabalhar lado a lado com robôs colaborativos para aumentar a produtividade. Isso gera espaço para exercer funções mais complexas e criativas. O profissional não será responsável apenas por exercer uma parte específica da linha de montagem, mas por todo o processo produtivo.

Diante dessa situação futura, segundo estudo da Unb¹, até o ano de 2026, 30 milhões de vagas poderão ser substituídas por tecnologias já disponíveis no mercado, que põe em risco 54% dos empregos formais no país.

Considerando os trabalhadores com carteira assinada no fim de 2017 (segundo a RAIS, do Ministério do Trabalho), cerca de 25 milhões (57,37%) ocupavam vagas com probabilidade muito alta (acima de 80%) ou alta (de 60% a 80%) de automação.

Operadores de caixa, por exemplo, têm 77% de probabilidade de serem substituídos por máquinas, gerando milhares de desempregados pelo país.

Outro exemplo é o e-comerce (comércio eletrônico) – modalidade de comércio que realiza suas transações financeiras por meio de dispositivos e plataformas eletrônicas, como computadores e celulares – combinado com a modalidade de “compre no site e retire na loja”, sendo esta na própria loja do site ou loja terceirizada apenas para a entrega do produto, que vem tirando o emprego de muitos vendedores do comércio varejista, onde a fronteira entre lojas físicas e virtuais vem se tornando mais tênue.

Outra transformação do emprego informal são os aplicativos que facilitam a vida dos clientes e precarizam e escravizam o trabalhador, a exemplo da UBER, onde a operadora estipula regras de comportamento por empresas para clientes e trabalhadores, por meio dos contratos de adesão que impõem a um e a outro. Atualmente esses contratos de adesão vêm sob a forma de “termos de uso”, mas têm a mesma natureza, e pedem a intervenção do direito do consumidor e do direito do trabalho para que sejam evitados os abusos pela posição privilegiada na relação que goza a empresa. Quanto às formas mais expressas de punição, não seriam a inativação temporária ou desativação a que estão submetidos os trabalhadores por aplicativo nada mais, nada menos, do que formas atualizadas das velhas suspensão e dispensa de empregados? A novidade é somente a forma em que há a supervisão, a direção, o controle e a manipulação pela empresa das duas pontas por intermédio da tecnologia de ponta atual.

Os autosserviços e as plataformas digitais estão transformando o emprego formal em informal, com a agravante do emprego 4.0 por não identificar quem é o empregador, e onde ele está localizado, se na cidade onde se desenvolve o trabalho, na Índia, na China ou em qualquer lugar do mundo. E como fica a representação desses trabalhadores no âmbito sindical, e sua proteção quanto a aplicação da lei protetiva a seus direitos?

Conclusões

Entre o quarto trimestre de 2015 e o primeiro trimestre de 2016, pouco mais de 14% daqueles que transitavam para a inatividade provenientes do desemprego faziam parte do subgrupo de inativos associado ao desalentado. No segundo trimestre de 2018 essa proporção havia subido para 22,4%. Esse resultado provavelmente reflete que a persistência do alto desemprego e a crescente duração deste faz com que uma parcela cada vez maior daqueles que desistem de procurar emprego declare-se desalentada.

Por sua vez, entre aqueles que transitaram do emprego para a inatividade, a proporção dos desalentados subiu de 11,2%, no início de 2016, para 16,7%, no segundo trimestre de 2018. Isso indica que o desalento aumentou não só entre aqueles que faz [1]bastante tempo se encontram desempregados, mas também entre aqueles que recém perderam a ocupação.

Rotatividade e Desemprego

Fica evidente que no mercado de trabalho a rotatividade é bastante elevada, quando se observa o número de contratações e desligamentos. Entre o primeiro trimestre e o segundo de 2018, saíram da condição de ocupados 8,8 milhões de trabalhadores, enquanto 9,4 milhões deixaram a situação de desocupados ou de fora da força de trabalho e conseguiram uma vaga, entre o número de pessoas desocupadas há um grande grupo de jovens que ingressaram em trabalhos precários e empregadas domésticas sem carteira assinada: com maior informalidade, menor cobertura previdenciária, com rendimentos inferiores à média do mercado de trabalho em geral, com ocupações típicas de uma economia com baixo dinamismo e maior dificuldade de oportunidades para os novos trabalhadores, o movimento descreve a falta de fôlego da economia brasileira para proporcionar, no curto prazo, alternativas mais estruturadas de trabalho, devido à fraca recuperação e a ausências de perspectivas melhores para o próximo período.

Desalentados

Vale ressaltar que os desalentados não devem ser encarados pejorativamente como preguiçosos e sim vistos como aquela pessoa que recebeu tantos “não” quando estava à procura de emprego que foi desestimulada, muitas vezes pelo grande número de desempregados, como se vê nas mídias filas intermináveis de pessoas à procura de uma vaga no mercado de trabalho. Outro motivo agravante que leva os desalentados a não procurar emprego são os custos, sejam de deslocamento e alimentação, no qual precisa dispendiar recursos que não possui para arriscar na procura de um trabalho.

Reforma Trabalhista que não deu frutos = Mais empregos formais

Como se observa, os dados demonstram que a reforma trabalhista, além de retirar direitos dos trabalhadores, de prejudicar as relações de trabalho, não contribuiu para o aumento de vagas de trabalho e nem diminuiu o alto índice de desemprego que persiste no país, tanto é que o índice de desemprego aumentou, tanto no saldo de desocupados, como no número de desalentados. A promessa do governo Temer não se cumpriu e contribuiu para o aumento da informalidade, isto é, trabalhadores sem carteira assinada.

Brasília, 4 de fevereiro de 2019.

 

Relações Institucionais

É permitida a reprodução deste conteúdo, desde que citada a fonte.

 

[1] Estudo do Laboratório de Aprendizado de Máquina em Finanças e Organizações da Universidade de Brasília (UnB), publicado nesta segunda-feira (28) pela Folha de São Paulo.