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Diretor: José Francisco de Jesus Pantoja Pereira
Gerente de Relações Institucionais: Sheila Tussi da Cunha Barbosa
Analistas de Relações Institucionais: Claudia Fernanda Silva Almeida
Renan Bonilha Klein
Assistente Administrativa: Quênia Adriana Camargo
Estagiárias: Tamiris Clóvis de Almeida
Letícia Tegoni Goedert

Entendendo a Dívida Pública e o porquê do ajuste fiscal

Quem acompanha os meios de comunicação deve se deparar todos os meses com notícias relacionadas à situação da dívida pública brasileira. Entretanto, a questão ainda é desconhecida por parte da população. Perguntas como “O que é a Dívida Pública Federal?” ou “Por que a Dívida Pública cresce a cada ano e o que o Governo está fazendo para conter o avanço dessa dívida?” são de interesse de toda a população.

Mesmo quem não compreende a questão da Dívida Pública sabe do crescimento do endividamento dos países, em especial os países europeus. No começo deste ano o mundo passou a prestar mais atenção ao cenário econômico turbulento da Grécia, que teve início em 2010 quando o país europeu teve de buscar ajuda financeira junto ao Banco Central Europeu (BCE) e ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para financiar o déficit público.

Os credores então concederam ao país o equivalente a € 240 bilhões, e em contrapartida a Grécia teria de cumprir um programa de reformas e ajuste fiscal a fim de reduzir sua relação dívida/PIB. Contudo o país postergou seu compromisso até o começo de 2015, quando começou um violento ajuste fiscal.

Na época a Dívida Pública grega era de 130% de seu Produto Interno Bruto (PIB) e hoje é superior a 180%. O PIB refere-se ao valor de todos os bens e serviços produzidos por um país. Ou seja, mesmo que todo resultado da atividade econômica do país em um ano fosse destinado ao pagamento da dívida ainda assim não seria suficiente para quitar a dívida.

Como disse uma vez o Ministro da Fazenda do período militar, o economista Delfim Neto, “dívida não se paga, administra-se” não foi um conselho seguido pelos gregos. Estima-se que a dívida tenha saltado de pouco mais de 20% na década de 80 para o patamar atual, principalmente logo após o acordo com os credores.

Diante de tamanho descontentamento da população com a condução da política fiscal imposta pelos bancos, a população se voltou às urnas para decidir se aceitariam continuar com as medidas de ajuste fiscal ou se não. O voto pelo “não” venceu com 61,31% de apoio, fortalecendo o apoio ao primeiro ministro grego, Alex Tsipras.

Pronto, o parlamento tem o aval da população para não seguir as regras impostas pelos bancos e poderá dar o calote na dívida, o chamado “default”. Todavia, a questão não é tão simples como parece, pois o futuro para a Grécia é incerto. Mas alguns cenários são possíveis de prever. O primeiro é a saída do país da zona do euro, obrigando o país a abandonar o euro e voltar a circular sua antiga moeda, o dracma. Com isso o Banco Central Europeu cortaria as linhas crédito ao país, e com uma moeda fraca levaria a inflação. Outro possível cenário é que o calote forçaria os credores a repensar as medidas impostas ao país grego e concedesse um novo resgate.

Mas então depois de toda essa explicação o trabalhador se pergunta: “E como essa crise na Grécia pode me afetar?”. Se a Grécia decidir não pagar mais seus credores, a crise que lá se instalou, acabaria por contagiar outros países europeus e em seguida poderia chegar aos países que ainda estão se recuperando dos efeitos da crise econômica, no caso o Brasil.

O que gera maior atenção ao crescimento da Dívida Pública brasileira para não se repetir o caso Grego ou o Argentino de 2001.

O que é a Dívida Pública Federal?

A Dívida Pública Federal (DPF) é composta pelas Dívidas Interna e Externa. A dívida é apropriada pelo Tesouro Nacional com o propósito de financiar operações definidas em lei e para refinanciar a dívida pública. Basicamente quando ocorre o décit orçamentário (receitas do governo são inferiores aos gastos) o Tesouro pode fazer dívida emitindo títulos públicos, conhecido como dívida mobiliária, ou pela celebração de contratos, chamada de dívida contratual.

Quando o pagamento e recebimento dos títulos ou contratos são realizados em moeda nacional, a dívida é caracterizada como interna. Já quando é emitida em moeda estrangeira, normalmente em dólar norteamericano, a dívida é classificada como externa.

Em junho de 2015, a Dívida Pública atingiu o montante de R$ 2,583 trilhões, sendo que 95% da dívida são de títulos públicos ofertados no mercado interno. Já a Dívida Pública Federal Externa (DPFe), que contempla a dívida mobiliária e contratual, fechou o mês de junho a R$ 121,28 bilhões.

O gráfico abaixo ilustra melhor essa ideia.
Distribuição da Dívida Pública

Fonte: Tesouro Nacional
Elaboração: CNTC

 

folha

Fonte: Folha de S. Paulo

 

A edição do Jornal Folha de S. Paulo de 14 de dezembro de 2005 dizia em sua capa que o país havia quitado sua dívida externa com o Fundo Monetário Internacional. Na época o Partido dos Trabalhadores utilizou o “feito” como propaganda, criando assim a falsa ideia de que o Brasil se livrou dos credores internacionais.

O que aconteceu foi o resgate antecipado de US$ 15,5 bilhões de parte da dívida junto ao FMI, por meio da emissão de títulos da dívida interna e externa a juros superiores ao que vinha sendo praticados pelo FMI.  Naquele período a dívida com  juro anual cobrado pelo FMI era de 4%, já os novos títulos emitidos variavam entre 8% (dívida externa) e 15% (dívida interna). A moral da história é que o Governo do ex-presidente Lula trocou uma dívida barata por outra mais cara.

Segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, em janeiro de 2003 o estoque de Dívida Externa era de R$ 270,15 bilhões e a Interna equivalia a R$ 575,01 bilhões, totalizando uma Dívida Pública Federal de R$ 845,17 bilhões. Oito anos depois, a Dívida Externa caiu para R$ 88,22 bilhões, porém a Interna aumentou para R$ 1,55 trilhão. Enquanto a Dívida Interna aumentou 171% em apenas dois mandatos, a Dívida Externa caiu 67%.

Se a Dívida Pública for bem administrada, pode trazer benefícios para sociedade e melhorar o funcionamento da atividade econômica. Mas se for mal administrada pode comprometer boa parte do orçamento da União, tornando o Estado refém das medidas estabelecidas pelos credores.

O que são títulos públicos?

Como já mencionado acima, a Dívida Pública é formada, principalmente, por títulos públicos emitidos pelo Tesouro Nacional. Os títulos são ativos de renda fixa (investidor é informado no ato da compra quanto irá receber no futuro) e podem ser qualificados de baixo risco, considerando que o risco do Governo aplicar “calote” é baixo.

Os títulos podem ser divididos em duas categorias:

  • Títulos Pré-fixados: o investidor sabe exatamente quanto irá receber até o final da aplicação;
  • Títulos Pós-fixados: o investidor é informado de quanto irá receber de acordo com a variação de um indexador.

Os títulos públicos mais conhecidos são:

  • Letras Financeiras do Tesouro (LFT): é um título pós-fixado atrelado à variação da taxa básica de juros (Selic). É indicado para o momento atual, já que o Banco Central realizou sete aumentos consecutivos na taxa e pretende continuar elevando a Selic até o final do ano;
  • Letras do Tesouro Nacional (LTN): é um título pré-fixado, pois permite o investidor conhecer com precisão no momento da compra quanto irá receber até o final da aplicação;
  • Notas do Tesouro Nacional Série F (NTN-F): é similar as Letras do Tesouro Nacional, entretanto este investimento paga juros semestralmente;
  • Notas do Tesouro Nacional Série B Principal (NTN-B Principal): é um título pós-fixado indexado pela variação da inflação oficial, ou seja, remunera em função de variações no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA);
  • Notas do Tesouro Nacional Série B (NTN-B): A única diferença para o NTN-B Principal é que este título paga juros semestralmente.

Posto isto, os títulos públicos estão em alta, visto que apresentam rendimentos superiores a outros investimentos de mesmo risco. Os investidores estrangeiros encontram na Dívida Pública brasileira uma oportunidade para especular. Os títulos da dívida norteamericana, os Treasury Bond (T-Bond), remuneram bem abaixo dos títulos brasileiros.

Por que a Dívida Pública cresce a cada ano?

Segundo dados do Banco Central do Brasil, a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), que inclui o Governo Federal, INSS, governos estaduais e municipais, registrou no mês de junho o equivalente a 63% do PIB, sofrendo elevação de 0,5 p.p. em relação ao mês anterior. A autoridade monetária ainda divulga o resultado nominal, que contempla os gastos do setor público e pagamento de juros, apresentou um déficit de R$ 462 bilhões ou 8,12% do PIB nos últimos 12 meses. O resultado sugere que a arrecadação diminuiu e que o Governo ainda encontra dificuldades em reduzir suas despesas correntes.

Além do descontrole das contas do Governo, outros fatores influenciam o aumento da dívida brasileira. O avanço da inflação no país em conjunto ao aumento da taxa Selic, contribuem para o crescimento da dívida, tendo em vista que os títulos NTN-B Principal, NTN-B e LFT são indexados por esses índices.

A emissão de títulos públicos com o objetivo de pagar juros da dívida também influencia o crescimento da dívida.

Só para entender melhor a evolução do estoque da Dívida Pública, no intervalo entre junho de 2014 a junho de 2015 a Dívida Pública Federal saltou de R$ 2,202 trilhões para os atuais R$ 2,583 trilhões, refletindo em um aumento de R$ 381 bilhões ou o equivalente a 17%.

Fonte: Siga Brasil
Elaboração: CNTC

O gráfico acima demonstra o quanto do orçamento público o Governo Federal destinou por grupo de despesas neste ano. As partes em vermelho e verde correspondem ao pagamento de juros e encargos da dívida como também a amortização e refinanciamento da dívida que juntas equivalem a 46% das despesas do Governo.

O que o Governo está fazendo para conter o avanço dessa dívida?

Para tentar diminuir a relação dívida/PIB o Governo Federal lançou um pacote de medidas que visam economizar recursos. A tão falada meta de superávit primário corresponde ao compromisso do Governo em economizar um determinado percentual do PIB para o pagamento dos juros da dívida.

Incialmente, a meta de superávit primário era de 1,19% do PIB ou R$ 66,3 bilhões. Agora o Governo decidiu reduzir a meta para 0,15% do PIB o equivalente a economia de R$ 8,7 bilhões. O movimento do Governo sugere a dificuldade em equilibrar as contas públicas, diante da queda na arrecadação tributária e os gastos continuarem altos.

Até o momento o Governo Federal não conseguiu lograr êxito na tentativa de conter o endividamento público.

E como o crescimento da dívida pode afetar o trabalhador?

Conforme a Dívida Pública cresce, menos recursos públicos ficam disponíveis para o Governo realizar em investimentos. Investimentos em saúde, transportes e educação são exemplos de despesas que podem ser contigenciadas. Os investimentos que não são realizados hoje podem impactar negativamente no futuro, contribuindo para o agravamento dos serviços prestados pelo Estado.

Por isso a administração da Dívida Pública é de interesse de todos os trabalhadores brasileiros.

Brasília, 04 de agosto de 2015.

 

Renan Klein
Analista Econômico