Sistema de escuta preocupa Ministério Público do Trabalho

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29/10/2013

A informação de que um sistema de escuta ambiental estaria instalado, desde o começo do ano, na frota oficial dos subprocuradores-gerais do Trabalho em Brasília deixou a carreira em polvorosa, num período em que denúncias de espionagem estão em voga. O fato será investigado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o órgão de fiscalização da categoria. A Procuradoria-Geral do Trabalho (PGT) nega a prática de escuta.

Tudo começou quando, no começo deste mês, um motorista atribuiu defeitos em um carro oficial à instalação recente de equipamentos de rastreamento via satélite. No edital e contrato para aquisição do sistema, um item chamou a atenção de procuradores: um “circuito de escuta sigilosa” listado entre as características técnicas do aparelho.

O dispositivo, chamado Módulo AVL (Automatic Vehicle Location), está disponível para até 37 carros oficiais, pelo custo anual de R$ 27 mil, segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT). O serviço inclui rastreamento dos veículos, com relatórios sobre localização e rota, tempo de motor ligado, quilômetros percorridos e velocidade. Segundo o edital, as informações são colocadas em um portal na internet, acessado por dez usuários indicados pela empresa contratada. As justificativas são “controlar com maior efetividade o emprego dos veículos pertencentes à frota, estabelecendo critérios de uso, racionalização e redução de custos”; e prevenir “roubo e sequestros relâmpagos”.

Imediatamente, a previsão de “escuta sigilosa” gerou o temor, entre procuradores, de que seus diálogos estejam sendo espionados. “Ninguém conversa mais em carro oficial”, disse ao Valor um membro do MPT.

Apontando o risco de violação à privacidade, o subprocurador-geral do Trabalho Otávio Brito Lopes apresentou um pedido de providências ao CNMP. “Quando verificamos que o sistema de rastreamento contemplava também uma escuta, todo mundo ficou indignado. Se o sistema é para a proteção dos procuradores, teríamos que ter sido comunicados.”

Ele reconhece que a administração do MPT negou a escuta, mas considerou a resposta insuficiente. “O que me deixa perplexo é que o edital e o contrato contemplam o sistema de escuta. Se não era necessário, por que foi incluído como exigência?”

Ao analisar o pedido de providências na semana passada, o conselheiro do CNMP Marcelo Ferra de Carvalho deu uma liminar impedindo o MPT de usar a escuta sigilosa “nas situações de deslocamento cotidiano” dos procuradores. “Em preliminar análise, o que se nota é que o módulo do rastreador de veículos da frota da Procuradoria-Geral do Trabalho dispõe da função de escuta clandestina, mecanismo de vigilância passível de enfraquecer, se não de aniquilar, a garantia constitucional à privacidade”, diz a decisão.

Procurado pelo Valor, o procurador-geral do Trabalho, Luís Camargo, afirmou que a escuta sigilosa não foi exigida “em momento algum” no edital: “o equipamento apenas possui, em sua especificação técnica, essa funcionalidade.” De acordo com ele, o sistema de escuta não chegou a ser instalado e os chips foram bloqueados para transmissão de voz. “A administração jamais autorizaria a instalação de mecanismo para viabilizar a escuta ou gravação de voz.”

Camargo informou que todos os carros oficiais da Procuradoria-Geral do Trabalho já contam com o dispositivo de rastreamento, exceto o usado atualmente por ele próprio – que aguardaria só uma autorização do fabricante para não perder a garantia do veículo. A empresa Vision Net, ganhadora do pregão, também diz que os microfones não foram instalados e que os chips estão bloqueados para tráfego de voz. Por via das dúvidas, segundo Camargo, os carros estão disponíveis para perícia técnica.

Fonte: Valor Econômico