‘Dumping social’: indenizações já ultrapassam R$ 200 milhões

Imprimir    A-    A    A+

13/01/2014

“Dumping social”. O nome pomposo começa a ganhar presença nas sentenças da Justiça do Trabalho. Consiste na prática contumaz de descumprir a legislação trabalhista, a ponto de prejudicar a concorrência. Em novembro, duas grandes empresas, Magazine Luiza e Usina Santa Isabel, foram condenadas a pagar indenizações por esses delitos. Somente este ano, as multas impostas somam mais de R$ 200 milhões, envolvendo também Casas Pernambucanas e Ford. A Magazine Luiza foi condenada já em segunda instância a pagar R$ 1,5 milhão. É acusada de impor jornadas exaustivas e sofreu 87 autuações por esse motivo. Firmou dois acordos, os chamados termos de ajustamento de conduta, com o Ministério Público do Trabalho em 1999 e 2003, ambos descumpridos, segundo a procuradora Regina Duarte da Silva, autora da ação.

“Restou evidente que a ré obteve redução dos custos com mão de obra de forma ilícita, com prejuízo às demais concorrentes que cumprem com as suas obrigações trabalhistas, bem como com dano a toda a sociedade”, escreveu o desembargador João Alberto Alves Machado em seu voto.

Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho acredita que essa tese chegue para análise dos ministros no início do ano que vem. Ainda não há sentenças superiores, transitadas em julgado, condenando empresas por “dumping social”.

– Quando há o descumprimento generalizado de obrigações trabalhistas que fazem que uma empresa tenha vantagem em relação a outra, o termo dumping social é interessante por resumir tudo que está acontecendo — afirmou o ministro.

Acusação de ponto britânico

A Magazine Luiza, procurada, disse que vai recorrer da sentença por discordar da decisão e que mantém “boas práticas de gestão de pessoas”, inclusive sendo premiada como uma das melhores empresas para se trabalhar por 15 anos seguidos. No processo, a empresa alega que não teve redução de custos, por ter pago mais pelas horas trabalhadas, o que teria não diminuído, mas elevado o seu custo. O desembargador rebate o argumento, afirmando que a constatação de horas extras acima do permitido, que são duas horas diárias, foi flagrada em lojas nos municípios de Franca, Araraquara, Matão, Presidente Prudente, Marília, Pedregulho, Santa Rosa do Viterbo, Igarapava, Ituverava, São Joaquim da Barra, Ribeirão Preto, Cravinhos, Batatais, Altinópolis, Brodowski e Monte Alto, o que comprovaria prática habitual da empresa.

A Usina Santa Isabel foi outra a ser condenada recentemente. Está recorrendo da sentença que a condenou a pagar R$ 1,3 milhão de indenização por “dumping social”. Além das jornadas maiores que o permitido, o Ministério Público do Trabalho acusa o braço agropecuário da empresa de forjar o cartão de ponto, o que é chamado de ponto britânico, no qual todos entram e saem exatamente no mesmo horário, sem qualquer alteração. Além disso, acusam a empresa de não fornecer água potável, instalações sanitárias, local para refeições e equipamento de proteção individual.

– Houve centenas de ações trabalhistas condenando a empresa e não houve melhora no ambiente de trabalho. O “dumping social” geralmente acontece em grandes empresas que têm condições de suportar as autuações e departamentos jurídicos grandes que podem recorrer a última instância — afirmou o procurador Rafael de Araújo Gomes, autor da ação.

Procurada, a Usina Santa Isabel disse que também recorreu da condenação em primeira instância. De acordo com o supervisor de administração de pessoal da usina, Egídio Garcia, a empresa “sempre cumpriu com as normas trabalhistas”, embora reconheça que tenha havido “alguns excessos na carga horária”, mas tudo acordado com sindicato dos trabalhadores e homologado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

– Tudo foi acertado em acordo coletivo — disse Garcia, lembrando que a usina tem se adequado às normas impostas pelos fiscais do trabalho.

Sentença de R$ 200 milhões

A Ford levou a condenação mais alta. A Justiça do Trabalho impôs indenização de R$ 400 milhões, a metade por “dumping social”. Neste caso, a terceirização de atividade-fim, por uma associação de valorização de pessoas com deficiência, levou à condenação. Sobre a ação em que também foi condenada, a Ford alega que “o processo em questão encontra-se sub judice”. E que, por isso, “aguardará uma solução final por parte dos órgãos competentes”.

A Casas Pernambucanas também foi condenada a pagar R$ 6 milhões por fraude no programa de aprendizes no início deste ano. Ela é acusada de usar a mão de obra do aprendiz como um funcionário comum. Procurada, a empresa não comentou.

Fonte: Valor Econômico