Edson Ribeiro Pinto

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09/08/2013

O Brasil vive o país-do-faz-de-conta. Durante anos e anos os desmandos e desfazeres foram anestesiando o nosso povo.

Os partidos políticos não têm uma linha ideológica? Faz de conta que está bem, é só mais uma gota no grande cálice da paciência do povo. Votamos em candidatos por sua simpatia, por um par de botinas novas ou para agradar o patrão, e está resolvido.

O governo pediu ao povo que entregasse suas armas, mas esqueceu de pedir também as armas dos criminosos?  As pessoas estão reféns da bandidagem? O poder da polícia está esvaziado porque os criminosos precisam ser tratados com mais respeito do que eles tiveram com suas vítimas?  Faz de conta que está bem, vamos esperar que nada aconteça com nossa família. Mais uma gota.

As penitenciárias são escritórios de trabalho do crime organizado atuando fora dela? Faz de conta que está bem.

As categorias de trabalhadores são enfraquecidas pela criação descontrolada de sindicatos sem a mínima condição de lutar pela classe?  Faz de conta…

A Justiça tem 70 milhões de processos pendentes para julgamento? Faz de conta…

Pessoas são condenadas em processos rumorosos, mas ninguém sabe se as penas um dia serão aplicadas?  Faz de conta…

Políticos são condenados por desvio de dinheiro público, mas são blindados pelo corporativismo, se elegem de novo e continuam aí? Faz de conta que está bem.  Quando foram eleitos ainda não existia a Lei da Ficha Limpa. Ora, esse detalhe os torna dignos de seguirem legislando em nome do povo?

O atendimento à saúde é precário, há municípios sem um único pediatra? Faz de conta…

As escolas não têm professores e as merendas são preparadas com produtos vencidos? Faz de conta…

Trens, ônibus e metrô viajam superlotados, nas grandes metrópoles o povo gasta quase 3 horas por dia indo e voltando do trabalho. O leite sobe, as frutas e verduras sobem, a inflação pesa no bolso do trabalhador, e agora ainda vão aumentar R$ 0,20 no preço do ônibus?! Não faz mais de conta que está bem, não! Essa foi a pequena gota que transbordou o grande cálice da paciência do povo.

O povo percebeu que os seus representantes eleitos já não trabalhavam para o povo, mas para si mesmos, em meio à corrupção e o corporativismo.

Milhões de pessoas foram às ruas simultaneamente em muitas capitais brasileiras exigindo o que há muito lhes vinha sendo negado: o direito de serem respeitadas e ouvidas; o direito de receber em benefícios sociais o dinheiro dos cinco meses que cada uma delas trabalha todo ano para contribuir com o governo em forma de impostos.

Os governantes ficaram atônitos: “que foi que eu fiz para justificar tanta revolta?!”. O problema não foi o que eles fizeram, foi o que não fizeram. Ou o que fizeram torto. Quando perceberam isso e a gravidade do momento, correram a se retratar, a apoiar as reivindicações populares dizendo “é isso mesmo! estamos com vocês, precisamos consertar, vamos já cancelar os aumentos das tarifas de ônibus, vamos reformar o sistema político, vamos ver todo o resto”.

Quanta compreensão! Só que tardia. Se assumem que estavam errados, por que não consertaram antes? Aí, como prova de que Deus é mesmo brasileiro, a resposta vem na providencial visita do Papa Francisco. Não por meio de suas pregações religiosas, mas de seu comportamento.

Se sua visita deixou uma marca, essa marca foi um profundo respeito pelo povo.  Em primeiro lugar, vimos um carro popular sem blindagem, trocado em outros momentos por um Papa Móvel também sem blindagem. Em segundo lugar, para agonia de sua segurança, inúmeras vezes o Papa fez parar o carro para descer e praticamente se misturar ao povo. Ele não apenas fala, ele quer tocar o povo e ouvir o povo. Ele quer dialogar com o povo.

Um papa que rejeita a blindagem e prega o diálogo – essa foi a grande mensagem.

O nosso povo não quer muita coisa: quer apenas a aplicação correta dos impostos que paga, quer a aplicação justa das punições, quer organismos públicos também sem blindagem, francos, sem protelar decisões ad infinitum, reportando ao povo com clareza como é aplicado o altíssimo imposto que ele paga.

Entendo que o povo brasileiro quer transparência, quer ser ouvido. Quer dialogar, que é a melhor forma de entendimento. Quer deixar as manifestações de rua para a história.

Se os nossos governantes ouvirem, os trabalhadores agradecem.

Edson Ribeiro Pinto –  Presidente da FENAVENPRO